Instagram: você realmente acha que a mudança dos likes tem a ver com saúde mental?
A mudança que havia sido anunciada meses atrás está em pleno funcionamento. Você não enxerga mais a quantidade de curtidas nos posts das outras pessoas no Instagram — a não ser que acesse sua conta pela web, o que pouca gente faz.
O anúncio do fim da exibição dos likes foi feito em meados de 2019. Por ora, o teste está sendo feito em apenas seis países: Brasil, Irlanda, Itália, Japão, Austrália e Nova Zelândia. Por isso, a explicação pouco convincente do Facebook para a medida, de que o Instagram está apenas preocupado com a saúde mental das pessoas, não foi questionada em âmbito global. Gigantes como Estados Unidos e grande parte da Europa ainda não foram afetados.
Conversamos com Caroline Portiolli, que habitualmente assina artigos sobre marketing digital na agência Knwein, de Porto Alegre, sobre esse fenômeno que afeta diretamente o marketing de influência e os influenciadores digitais. Você pode ouvir o bate-papo na edição #148 do Podcast-se, disponível abaixo e no Spotify, ou ler a transcrição a seguir.
Cassio Politi: O nosso desafio hoje é tentar explicar por que o Instagram decidiu sumir com os likes para quem não é o dono da conta. Você tem as suas conjecturas sobre a razão pela qual o Instagram tomou essa decisão?

Caroline Portiolli: Eu acredito que seja principalmente pela questão da saúde mental e da competitividade. Focava-se muito em likes, fotos e curtidas. O público e as marcas foram afetados por essa competição de quantos likes tem cada publicação. Isso faz com que as pessoas não se preocupem com a qualidade do conteúdo, e sim com quantos likes conseguem nos primeiros cinco minutos de publicação. Isso afeta muito a saúde mental, a competitividade e também faz com que os profissionais de comunicação foquem nessa questão dos likes em relatórios. O like é a métrica de vaidade. Só infla ego e não traz resultado nenhum.
Cassio Politi: Essa é a explicação oficial do Facebook, que é o dono do Instagram. E foi o que muita gente repetiu. Então, por enquanto, a explicação é essa que você deu: “estamos preocupado com a saúde mental”. Mas não tem um viés econômico aí também?
Caroline Portiolli: Certamente, há um viés econômico e mais capitalista por trás, sim. Porque redes sociais vendem — e precisam de dinheiro para existir. Fazer com que o seu post ou foto tenha alcance melhor vai obrigar a investir em anúncios, o que não é tão barato assim. Tento acreditar que a explicação da saúde mental possa ser verdadeira, mas no fundo talvez não seja.
Cassio Politi: Talvez ela esteja verdadeira por ora porque essa medida está em teste em poucos países. A explicação ainda cola porque o impacto financeiro é muito pequeno. Se você quiser entender o mundo, lembre-se da frase do famoso escritor William Goldman: “follow the money”. Ou seja, “siga o dinheiro”. De algum jeito, o Facebook vai arrumar uma forma de capitalizar tudo isso com anúncios. Uma possível explicação é a seguinte: hoje, um instagrammer forte anuncia um carro, por exemplo, para o público dele. Digamos que seja uma Audi. Então a Audi vai lá e dá uma grana para o Instagrammer, só que o Instagram não ganha um centavo com isso. Quer dizer: o dinheiro está passando ali, da marca direto para o influenciador, sem o Instagram cobrar o pedágio. E isso deve estar incomodando. Será que não é isso também que está provocando alguma mudança?
Caroline Portiolli: Pode ser que sim. Hoje em dia, a gente tem um marketing de influência muito grande. Em âmbito mundial, marcas divulgam seus produtos com influenciadores que têm 200 milhões de seguidores. Os microinfluenciadores também estão ganhando muita força porque geram muito retorno de engajamento com o público. Então, existe esse viés. O dinheiro está passando por ali, e não está ficando nada com o Instagram, que diz: “vamos diminuir isso e pegar um pouco para a gente também”. Porque redes sociais são empresas.
Cassio Politi: Na verdade, esta é uma fase de testes, certo? Tanto que, se entrar no Instagram pela web, você ainda enxerga as curtidas das pessoas normalmente. Só no aplicativo que você não enxerga.
Caroline Portiolli: Sim, você não enxerga as curtidas dos outros na web. No aplicativo, as marcas ainda vão continuar enxergando suas próprias curtidas. O que muda é como você vai enxergar as outras empresas e os outros influenciadores. Talvez isso seja muito bom para quem trabalha com comunicação. Porque as pessoas vão parar de escolher o influenciador pelo número de curtida.