Por que o Instagram vai esconder os likes — e como isso impacta o marketing de influência?
A notícia de que o Instagram pretende esconder as curtidas das postagens foi confirmada pelo Facebook no final de abril, durante sua conferência, a F8, em San Diego, na Califórnia.
Seguindo uma famosa frase escrita pelo escritor americano William Goldman, a medida tem menos a ver com usabilidade e mais a ver com negócios. Em 1976, Goldman inseriu no filme Todos os Homens do Presidente, de 1976, a máxima que norteia este post: “follow the money”. Ou, em bom português, “siga o dinheiro”.
O Instagram deveria ser a rede social onde as pessoas se divertem e relaxam a mente. Mas não é isso que está acontecendo. Pelo contrário. O Instagram é hoje a principal fonte de angústia entre os usuários de redes sociais, especialmente os jovens.
Publicada no início de maio de 2019, uma reportagem da revista Superinteressante traz dados de uma pesquisa recente realizada pela instituição de saúde pública do Reino Unido, Royal Society for Public Health, em parceria com o Movimento de Saúde Jovem. As principais conclusões ajudam a entender a iniciativa da direção do Instagram:
- Redes sociais são mais viciantes que álcool e cigarro.
- Entre as redes sociais populares, o Instagram foi avaliado como a mais prejudicial à mente dos jovens.
- O compartilhamento de fotos pelo Instagram impacta negativamente o sono, a autoimagem e a aumenta o medo dos jovens de ficar por fora dos acontecimentos e tendências — distúrbio conhecido como FOMO (“fear of missing out”).
- Segundo a pesquisa, o site menos nocivo é o YouTube, seguido do Twitter.
Essa pesquisa não é a única que mostra dados nesse sentido. É apenas a mais recente. A direção do Instagram se vê obrigada a agir energicamente contra isso não exatamente por pressão da sociedade ou da comunidade científica, mas pela preservação de seu modelo de negócios. Quanto mais tempo os usuários passam no Instagram, maior a quantidade de anúncios exibidos e, portanto, maior o faturamento.
A hipótese é a de que os likes, quando vistos publicamente, fomentam uma competição entre os usuários. Aplicando lógica simples: quando há uma disputa em que pouquíssimos usuários populares vence enquanto outros milhares perdem, é o sentimento de frustração — e não o de satisfação — que atinge a grande maioria das pessoas.
Eis o que disse Adam Mosseri, head do Instagram nos Estados Unidos, em uma reportagem do The Washington Post:
“Queremos que as pessoas se preocupem um pouco menos com quantas curtidas elas conseguem e que gastem mais tempo se conectando com as pessoas com quem se importam. O Instagram não pode virar uma competição. Queremos que seja um ambiente menos pressurizado.”
Ao que tudo indica, a contagem de curtidas não vai ser extinta do Instagram. Ela continuará sendo vista pelo dono da conta. A medida foi primeiro testada internamente e, depois, com um grupo reduzido de usuários do Canadá.
Mesmo sendo apenas um teste, outros players cogitam caminhar na mesma direção. Jack Dorsey, um dos fundadores do Twitter, disse algo um tanto surpreendente na esteira da repercussão do anúncio do Instagram no F8. Ele afirmou que, se pudesse criar hoje uma rede social do zero, repensaria a ênfase em curtidas e retuítes. E revelou que há o projeto de um app em andamento, chamado twttr, com essa característica.
Marketing de influência
Em tese, influenciadores podem ser afetados pela mudança no Instagram — mas muito pouco. Se a quantidade de curtidas for um indicador de desempenho usado para aferir ações com uma marca, ainda assim ele terá como reportar esse indicador.
De toda forma, o Instagram estuda criar uma funcionalidade que permita aos influenciadores digitais compartilhar os resultados de suas ações com clientes.
Há sinais, porém, de que os influenciadores digitais já alcançaram um estágio de maturidade que vai além da simples entrega de quantidade de curtidas por uma campanha. Não que o número de likes seja desprezível, mas o fato é que ações causam impacto muito além dos indicadores de redes sociais.
Com 159 mil inscritos no Instagram, André Pilli, vê prós e contras na iniciativa. Mas concorda com ela.
“Por um lado, considero a medida interessante porque os likes geram muita ansiedade. Por outro lado, quando se trata de marcas, os likes são um indicador importante para medir engajamento. Isso pode ser prejudicial, sim. Ainda assim, de uma forma geral, eu acredito que essa medida vá ser saudável para a plataforma como um todo.”
O site Global News consultou alguns instagrammers sobre a mudança. A maioria pareceu despreocupada.
Por exemplo, Mina Gerges (104 mil seguidores), afirmou:
“Em algum ponto da minha carreira, eu conseguia 20, 40 ou até 60 mil likes numa foto. Hoje, não mais. Minha preocupação é postar algo mais valioso e autêntico do que, por exemplo, memes que podem me render milhares de likes.”
Eleni Kyri (30 mil) vai numa linha parecida:
“Amo a ideia [de esconder likes] porque vai ajudar a tirar o foco de quantos likes uma foto recebe, As pessoas vão poder postar fotos sem estressar sobre quantas pessoas curtiram aquilo”.
Campo desconhecido
Ainda que conte com o apoio dos influenciadores digitais, o fato é que o Instagram se vê diante do desconhecido. Se esconder curtidas se tornar um padrão para todos os usuários num futuro próximo, algumas relações humanas também serão afetadas, segundo avalia Karen North, professora de psicologia com ênfase em mídias sociais da Universidade de Southern California, nos Estados Unidos.
Segundo ela, quando curtimos a foto de um amigo, fazemos um gesto de camaradagem, com o intuito de ajudá-lo a promover seu conteúdo. “Se, por um lado, podemos focar no aspecto negativo de comparar likes, por outro, também é verdade que as pessoas gostam do jogo de apoiar um post, um amigo ou um influenciador”, pondera a professora.
Bem, se as novas regras do jogo forem realmente uma preocupação para quem usa Instagram como uma ferramenta importante de marketing, talvez caiba a velha frase de um outro escritor, o brasileiro Érico Veríssimo. “Quando os ventos de mudança sopram, umas pessoas levantam barreiras, outras constroem moinhos.”
Takeaway
O Instagram estuda remover os likes porque, entre outras razões, desconfia que ele cause mais angústia do que bem-estar, que é o combustível de seu modelo de negócios.