Mito #4: celebridade não pode ser influenciador
O quarto capítulo da série de mitos do marketing de influência diz respeito a uma crença um tanto radical, que mantém influenciador e celebridade conceitualmente separados por uma barreira intransponível. De forma didática, fazendo uma espécie de spoiler do que vem a seguir neste post, cabe observar com discernimento os seguintes pontos:
- Celebridades e influenciadores digitais são diferentes entre si, mas o mercado os confunde.
- Uma celebridade pode, sim, se tornar um influenciador digital. Basta cultivar o próprio público fiel.
Afinal, qual a diferença?
A base da diferença entre celebridades e influenciadores está no caminho que cada um percorreu até ganhar relevância. Enquanto influenciadores tiveram boa performance em canais digitais e sociais, as celebridades são fruto da mídia tradicional. Por exemplo, Whindersson Nunes, o brasileiro mais popular do YouTube, era um anônimo antes de seu canal explodir e alcançar quase 25 milhões de inscritos (em novembro de 2017). Muito antes de o YouTube existir, Ivete Sangallo já fazia sucesso como cantora. Segundo pesquisa feita pelo Instituto Ipsos no final de 2017, ela é a celebridade mais famosa do Brasil.
Whindersson e Ivete trilharam caminhos diferentes: ele é digital, ela é offline. Um post do Simply Measured reforça a diferença entre influenciador e celebridade com a seguinte afirmação:
“É uma questão de alcance em massa versus impacto em massa. Influenciadores têm peso em temas. Celebridades têm exposição.”
O mercado se confunde
Parece bem simples e clara a diferença. Celebridade cresceu na TV, no rádio, em revistas. Influenciadores, em redes sociais. Tanto que a própria pesquisa do Instituto Ipsos dividiu seu estudo em duas categorias — celebridades e influenciadores — para analisar fama e influência em cada uma delas.
Portanto, celebridade é celebridade, influenciador é influenciador. Simples assim. Não tem como confundir, certo? Bem… mais ou menos. Existe uma área cinzenta entre essas duas categorias, e é justamente nela que que até pessoas habituadas ao debate se confundem.
Vejamos um exemplo. Em maio de 2017, a cantora e atriz americana Jessica Simpson estrelou um anúncio dos produtos Proactiv, que combatem problemas de pele, como acne. Seria apenas mais um típico caso de garota-propaganda endossando a mensagem de uma marca se não fosse por um detalhe: não teve sérios de pele quando mais jovem. Por isso, em vez de simplesmente gravar comerciais com textos publicitários, Jessic contou a sua história real, em primeira pessoa. E seu testemunho foi assinado pela marca.
Acontece que o caso de Jessica Simpson mistura os dois elementos definidos pelo Convince & Convert e deixa um ponto de interrogação no ar: afinal, nesse caso, a artista deve ser classificada como celebridade, influenciadora ou ambos?
Outro aspecto que confunde qualquer análise é o fato de que celebridades não estão restritas à mídia tradicional. Elas estão na mídia digital também. Segundo o Statista, o youtuber mais popular do mundo é o sueco PewDiPie, um autêntico influenciador digital. Mas aparecem entre os top-10 algumas celebridades, como os cantores Justin Bieber, Rihanna, Katy Perry e Talor Swift — todos impulsionados pela VEVO, uma marca que nasceu na internet.
E aí? Esses artistas são influenciadores ou celebridades?
Como diferenciar corretamente?
Em meio à confusão, o recomendável é se basear em princípios sólidos e, assim, esclarecer quem é quem nessa história. O princípio mais amplo é o tripé da ressonância, relevância e alcance. Um influenciador digital, para ser rotulado como tal, precisa ter os três atributos.
Uma grande diferença entre o influenciador digital e a celebridade está na formação de um público fiel. Em outras palavras, o influenciador é dono daquele público. Entenda por “dono” o fato de ele ter formado o público única e exclusivamente a partir do seu conteúdo, bem ao seu estilo. É por isso, inclusive, que ele mantém altíssimos níveis de engajamento.
Por esses critérios, fica fácil responder as perguntas feitas há pouco neste post. Jessica Simpson e a penca de cantores da Vevo são celebridades. Não podem ser chamados de influenciadores simplesmente porque não formaram seu público. Segundo o blog de Shane Barker, o influenciador é um expert, tem alto engajamento, cria o próprio conteúdo e costuma ser mais focado em um segmento e em canais específicos. Nenhum dos pop stars citados se enquadra nessas características.
Ainda em relação a critérios, o influenciador não necessariamente tem um público gigantesco. A brasileira Mayra Medeiros, dona do canal “Nunca te Pedi Nada“, reúne cerca de 700 mil inscritos no Youtube. Já Nataly Nery é seguida por 200 mil no Instagram. Seus públicos não chegam perto das multidões que seguem astros da música, do cinema ou do esporte. Ainda assim, as duas são, sim, influenciadoras — ou microinfluenciadoras — com potencial para despertar o interesse de marcas que queiram falar com os públicos a quem elas se destinam. Por uma simples razão: elas impactam diretamente seus seguidores. Em maio de 2016, o Twitter fez um estudo e concluiu que 40% de seus usuários já compraram um produto porque o viram sendo usado por um influenciador ou microinfluenciador no Instagram, Twitter, Vine ou YouTube.
Existem, portanto, influenciadores e microinfluenciadores. A mesma comparação, porém, não se aplicaria a celebridades. O fato de Ivete Sangallo ser uma celebridade por ter milhões de fãs não significa que uma cantora de música baiana que faça shows em bares e festas de casamento de Salvador possa ser considerada uma “microcelebridade“.
Celebridade que se torna influenciador
Mantenha em mente a premissa central de que o influenciador constrói público fiel enquanto a celebridade apenas se expõe à massa das mídias tradicionais. Mas, ao mesmo tempo, considere o dinamismo do mercado e das pessoas. O que impede um famoso de aproveitar a fama herdada da mídia tradicional para impulsionar sua popularidade em canais sociais? Nada.
A diferença, de novo, está na criação de conteúdo. É isso que distingue um influenciador. O fato de um jogador de futebol ou ator de cinema abrir uma conta no Instagram e ser seguido por milhares de pessoas não o transforma automaticamente num influenciador. Para isso, ele precisa cultivar aquele público, criando conteúdo valioso e original — e não ficar simplesmente postando fotos de seu dia a dia.
O apresentador do SBT Celso Portiolli é um ótimo exemplo. Ele conta com 3,3 milhões de inscritos em seu canal no YouTube. Lá, o personagem que encarna no SBT — que em certa medida lembra Silvio Santos — dá espaço ao comportamento típico de um youtuber. Em entrevista à Folha em agosto de 2017, Portiolli falou sobre sua aventura no YouTube:
“Começou na brincadeira e virou uma brincadeira séria. Agora tenho de fazer vídeos frequentemente. Às vezes, aperta demais porque faço tudo sozinho: ilumino, escrevo, edito, gravo. O que me motiva é exatamente a responsabilidade em ter mais de 3 milhões de pessoas esperando ali alguma coisa legal, diferente da televisão. Isso que me motiva. Esse contato com a galera do YouTube é maravilhoso. Antes eu só tinha certeza de uma coisa: as pessoas me viam no SBT. E hoje é incrível como eu tenho fãs de todas as idades, pessoas que acompanham meu trabalho.”
Talvez Celso Portiolli não tenha percebido, mas não foi só o canal dele que ficou com cara de youtuber. A resposta para a repórter da Folha também.
Conclusão
Uma celebridade pode aproveitar sua fama criada em mídias tradicionais para impulsionar a formação de público, tornando-se um influenciador digital. Para isso, precisa produzir conteúdo e contar com ótimos níveis de engajamento. O simples fato de ser famoso e ser ativo em plataformas digitais ou redes sociais não faz dele automaticamente um influenciador.
O tema foi abordado no Podcast do Comunique-se. Clique no player abaixo para escutar o programa.
Os cinco mitos da série
A série de cinco mitos do marketing de influência é composta pelos seguintes tópicos e suas respectivas datas de publicação:
- Influenciador é garoto-propaganda (15/11/2017)
- Marcas não influenciam pessoas (22/11/2017)
- Marketing de influência só é possível pagando (29/11/2017)
- Celebridade não pode ser influenciador (06/12/2017)
- Marketing de influência é só para B2C (13/12/2017)